Estou orfã de séries. Não sei o que ver, sinto que não há nada novo que me entusiasme, nenhuma grande série por descobrir. Acabei From da HBO e estou a gostar, tenho receio que caso não seja concluída na próxima temporada se perca no meio de tantas historiazinhas paralelas e aborrecidas que interessam a um total de zero pessoas. Tive a ideia de começar a ver Gomorra. Algures em 2009 vi o filme Gomorra que não me deixou boas recordações mas sabendo que tanto o filme quanto a série são baseadas num livro, o que abre sempre margem para diferentes abordagens e adaptações, pensei "bem, já que o filme não foi grande coisa, talvez a série compense".
Terminei a primeira temporada e estou assim numa versão senhora velhinha em frente à TV a papar a sua novela da tarde, pico de satisfação e lazer. Gomorra é a minha novela da noite. Como o livro que estou a ler não anda nem desanda, é disto que me ocupo antes de dormir. Adorei a primeira temporada e estou super curiosa para ver o que vem aí. Comecei a adorar a personagem Ciro e agora está a irritar-me, cumprindo o seu objectivo. Passei de odiar a simpatizar com Genny. No fundo são todos maus, criminosos horríveis, mas por quem torcemos para que se dêem bem na vida. Sou um coração mole até com a bandidagem.
Nunca fui a Itália e acho uma piada à semelhança arquitéctonica entre os prédios dos bairros sociais que aparecem na série e o bairro onde nasci e fui criada. De classe baixa em classe baixa, de Chelas a Nápoles, juntos na pobreza e degradação social. É o capitalismo a funcionar, parabéns Europa.
Ps: aquela comparação a Breaking Bad é absolutamente ridícula.
Damos sempre uma oportunidade ao Sr. Night, não é?
Há coisas boas em Trap. A indústria musical e o conceito filme-concerto funcionam muito bem aqui, com todas as idiossincrasias associadas às massas. Do meio para o final é o descalabro. O filme não precisava ser tão longo nem tão irritante, cheio de acções completamente idiotas e irrealistas por parte das personagens. A pessoa vê até ao final para comprovar o quão mau consegue ficar e não se desilude: só piora e anula todos os pontos positivos que se arrancam à força até perdermos a esperança. Mais uma vez.
Já Caddo Lake foi uma boa surpresa, não sendo uma obra-prima, entretém, não aborrece e tem estrutura. A atmosfera em que a história se desenrola, o pântano, as habitações coladas ao rio, as deslocações de barco, soam quase a fantasia sem o serem. Foi satisfatório seguir as pistas e compreender que tipo de filme tínhamos à frente; a critica à exploração da natureza, à acção humana invasiva e destruidora, encaixa bem na narrativa e oferece-nos um principio, meio e fim. O bom elenco só reforça a sensação de tempo bem passado em frente à televisão. Só quando estava a escrever isto é que percebi que tinha a mãozinha do Sr. Night. Afinal há esperança!
Estou a rever Sopranos. No espaço de 4-5 anos é a terceira vez. Durante muito tempo resisti-lhe. Acreditava que o tema "máfia" se esgotava rapidamente, e após os filmes clássicos que toda a gente já viu pelo menos uma vez na vida, duvidava do que teria de tão fascinante ou original. Ser uma criança quando a série iniciou também não ajudou. Imaginava que fosse só violência, perseguições policiais e intrigas entre grupos. Sucede que o meu eterno camarada venera Sopranos e num momento de "não há nada de jeito para ver" seguiu-se um "vamos ver Sopranos, por favor, é agora, tu vais adorar!". E lá lhe fiz a vontade (depois da nossa filha é capaz de ter sido a melhor coisa que o homem me deu). Adiante, não vou estar a debitar reflexões sobre esta obra-prima das séries de televisão, até porque análises e criticas feitas por gente entendida há por aí aos pontapés. A verdade é só uma: The Sopranos é a melhor série de sempre e não levo a sério qualquer pessoa que tenha uma opinião diferente. Não quer isto dizer que não existem outras séries excelentes. Mas nenhuma atinge o brilhantismo que Sopranos encerra e é este brilhantismo que nos faz regressar para assistir com fascínio, uma e outra vez, à imensidão de conceitos, ideias e emoções que são exploradas naqueles episódios.
Decidimos rever a série após vermos o documentário que a HBO lançou este mês com David Chase, o criador da série. Acho que vai acontecer a muita malta o estranho e maravilhoso fenómeno chamado: saudade. É uma série tão marcante que a sentimos como se fosse um membro da família. Rimos, sofremos e choramos com ela. Logo, também temos saudades. Ver o documentário lembrou-nos que era bom combinarmos um jantar, ou neste caso rever, porque não se levam séries a jantar fora. Aconteceu-me o mesmo depois de ver o filme The Many Saints of Newark.
É um documentário bonito que aquece o coração e nos relembra que, às vezes, as mentes mais perturbadas (e a necessitar de terapia) são aquelas que nos oferecem verdadeiras obras-primas.
Há uma cena na história de Tony Soprano. Há o antes e o depois de ver The Sopranos. O mundo divide-se entre aqueles que viram, sentiram e compreenderam; os outros que viram e não perceberam patavina; por fim há o grupo dos que ainda não viram, nem a série, nem a luz (das séries, tipo têm a possibilidade de entrar no paraíso e obter sabedoria televisiva e cinematográfica a um nível só existente naquelas seis temporadas e não passam do limbo). Estão à espera do quê?
Oz é uma das minhas séries preferidas de sempre. Tirando uma temporada meio experimental (que ainda assim não prejudica o todo) é uma obra-prima. Tem seis temporadas e está disponível na hbo max. O enredo gira em torno de uma prisão que tem uma ala-projecto, Emerald City, em que o responsável tenta implementar medidas mais humanas e empáticas no dia-a-dia dos presos, maioritariamente condenados por crimes violentos relacionados com gangs, drogas, alcoolismo, abuso sexual. Oz pertence aquela época em que uma série nos fazia reflectir fortemente sobre a sociedade em que nos inserimos, a complexidade moral sobre como lidar com o crime e a penalização, o debate sobre a origem do mal e as medidas de reabilitação, o meio como molde para a existência humana...Enfim, o que não falta são possíveis reflexões conforme vamos avançando nos episódios e as histórias das personagens se vão solidificando. Não há heróis e vilões, tão pouco serve como aconchego depois de um dia de trabalho. É desconforto e crueza mas em bom.
Ando a ver outra série, disponível aqui, que me recorda Oz e SOA. A acção não decorre dentro de uma prisão, mas a prisão em Kingstown é parte fulcral da narrativa; existe toda a questão de gangs, criminosos violentos, e de como os órgãos de poder controlam, minimizam ou maximizam os seus actos, mediante os seus próprios interesses. É o clássico jogo de poder entre políticos e a rua. Está muito bem estruturada. São três temporadas, até agora, que me têm satisfeito a ausência deixada por outras grandes séries (menos filosofia e mais explosões, não se pode ter tudo não é?). O centro de poder é o presidente da câmara lá do sítio, Mike McLusky, que é também ex-condenado e um homem com amizades curiosas. O actor Jeremy Renner é um homem cheio de classe, gostei muito do trabalho dele em Wind River e em Arrival (um favorito).
Podendo e querendo: vejam Oz. E depois vejam Mayor of Kingstown.